terça-feira, 27 de maio de 2008

Momentos de Glória - Nuno, 30 Anos

Regresso ao Eldorado - Edição nº 22

Quando o fedelho que aparece na fotografia aí de baixo com um fato espacial nasceu já eu tinha feito sete anos. Já sabia ler e escrever algumas coisas, assim como tirar macacos do nariz com arte e requinte, algo que mantenho até hoje.
Só para que sejam enumeradas algumas das qualidades que tinha já adquirido, antes deste tipo aparecer.

Reza a lenda que ele foi a prenda de anos que eu escolhi para o meu sétimo aniversário, mas tendo eu nascido a 21 e ele só a 27, convém relembrar pela enésima vez que a dita prenda chegou atrasada seis dias.
Pior do que isso, o fedelho foi-me apresentado sem papel de embrulho e lacinho a condizer, parecia meio cor de rosa e cheirava a leite, além de ter a cabeça tenrinha e ligeiramente bicuda.
Algo entre um leitão da Bairrada e um marciano.

Considerações desta índole à parte, o puto era giro como tudo e nasceu ali algo que nem o tempo, a Al-Qaeda ou o Sócrates conseguiram destruir.
Estão a ver aquilo a que chamam "amor"?
Acho que é ainda mais do que isso, trata-se daquela sensação de saber que um e outro vieram do mesmo sítio, chegaram ao mundo da mesma maneira, beberam do mesmo leite e inutilizaram fraldas de modo igualmente badalhoco.

O Nuno André - reza a mesma lenda que fui eu que escolhi o nome - cresceu, tornou-se uma criança entre o complicado e o ternurento, foi companheiro inseparável de longas tardes de brincadeiras e o melhor amigo que se pode ter.
Cresceu também rodeado de alguns problemas respiratórios e uma das mais belas notícias que me deu, foi a de ter deixado de fumar, o que espero ser para sempre.
Não quero voltar a encontrá-lo assustado e perdido, ligado a soro, num corredor de hospital.

Nos primeiros anos, à conta destes problemas respiratórios, uma divisão lá de casa chegou mesmo a ser transformada em "quarto de vapores" e quase nasceram ali aquilo que seriam hoje as afamadas Termas de Pinhal Novo.
Não foi preciso porque ele lá foi melhorando; o que deu imenso jeito para aproveitar aquele quarto-sauna para algo mais normal como... fazer um quarto normal.

Uma das adversidades mais complicadas que o Nuno teve de enfrentar está directamente relacionada com a condição, não escolhida por ele, de ter nascido meu irmão.
Não foi, não é, não será nunca fácil.
Ele teve que se submeter a 10 mil atrocidades que começaram logo quando lhe enfiava o biberão de água goela abaixo quando ele chorava.
Pensava eu que o gajo tinha sede.

Depois vieram múltiplas brincadeiras saídas da minha fértil e tortuosa imaginação, sendo a mais emblemática a do "barco-manta".
Consistia no seguinte delírio: eu, ele e mais seis bonecos de pelúcia meio esburacados subiámos para uma manta e zarpávamos para mares desconhecidos.
Adepto de densos jogos psicológicos desde tenra idade, tornava a viagem numa autêntica montanha-russa de emoções, já que promovia ódios e empatias entre os imediatos de pelúcia, ao mesmo tempo que o mar revolto ia comendo quase literalmente a embarcação.
A manta ia encolhendo até chegar ao ponto de estarmos todos em cima uns dos outros, evitando os tubarões esfaimados representados pelas minhas mãos abertas fazendo "nhac, nhac".


info: Nuno André Cardoso nasceu a 27 de Maio de 1978, no Montijo. É honesto, trabalhador incansável e grande adepto do Benfica como se poderá constatar por todos os cantos lá da casa dele. Enfim, ninguém é perfeito.

Anos mais tarde, fundei o clube "Os Exploradores" com ele, o Nelson, o "Carocha" e penso que mais alguns tipos que depressam fugiram da seita.
A ideia era bem mais saudável: passeios pedestres a locais maravilhosos do reino caramelo, como a Barragem da Salgueirinha, a Mina do Barro, a fábrica Cerapa, entre outros.
Havia quotas a pagar que ninguém pagava e, por isso, nunca foram concretizadas as viagens ao "estrangeiro" como a Setúbal ou Évora.

Mas, o que acabou com o clube, foram algumas atitudes ditatoriais do chefe do gang que obrigava a que, no final de cada passeio, os jovens exploradores tivessem que compor ou desenhar aquilo que mais e menos tinham gostado da experiência.
Acho que alguns deles chegaram a ponderar denunciar-me aos sindicatos do sector.

A adolescência foi mais normal, se é que há normalidade na adolescência, mas não fazia sentido, nos meus 21 anos, obrigar o Nuno, de 14, a novos e desenfreados caprichos da minha imaginação.
E assim, limitámo-nos a jogar futebol, ténis e outras modalidades mais normais e até com estatuto olímpico, se bem que continue a achar, na verdade, que o "barco-manta" tem condições para ser desporto de alta competição.

O Nuno cresceu... cresceu... cresceu... cresceu para cima e para os lados, até ultrapassar a barreira psicológica dos 100 quilos.
Casou, teve um filho - que enche uma casa e que, juro, ainda há-de provar da venenosa capacidade inventiva do tio João Paulo -, tem a sua casa, o seu emprego, a sua vida, a sua careca, enfim, o costume nestas histórias aparentemente iguais mas, desde que esmiuçadas com paixão, são afinal únicas, e com o poder de tatuar na alma, eternamente, uma marca de união e fraternidade sem prazo de validade estabelecido.

Hoje, por volta da hora do almoço, fui buscá-lo no velho Saxo - que logo se encostou ao chão quando tão poderosa figura entrou - e fugi com ele para um dos meus locais favoritos, para podermos almoçar no meu restaurante favorito, o meu prato favorito.
Porque sempre fui assim, mais que disponível para partilhar as coisas boas da vida com quem mais gosto.
E, por falar em gostos, espero que ele tenha gostado da prenda-almoço. Pelo menos devorou o que se lhe apresentava à frente como se não houvesse amanhã.

Ele merece tudo o que há de bom nesta vida e espero que repita esta marca das três décadas, mais umas três vezes, penso que 120 anos é uma boa idade para arrumar as coisas, fechar as portas, partir e reactivarmos depois "Os Exploradores", algures, no além.

Nuno, o mano gosta muito de ti.
Para sempre.

Amanhã há nova viagem na máquina do tempo.
Venha comigo assassinar saudades.

9 comentários:

Migration to the Cloud disse...

Conta comigo! (Desde que as novas quotas nao sejam tao caras como antigamente...)

nf

Migration to the Cloud disse...

Ah! E parabens ao Nuno!

nf

Patrícia disse...

Nuno, por intermédio do teu irmão, dou-te os meus parabéns.

João Paulo Cardoso disse...

Null Fame:
Protesto! As quotas custavam menos que um pacote de bolacha Maria!

Um abraço.

P.S: Aposto que nesses verdes campos da british landscape há muito que explorar!

João Paulo Cardoso disse...

Patrícia:
Serão entregues, concerteza.

Beijos.

Anônimo disse...

esse nuno que tantas vezes vi brincar no chao da casa com os bonecos e carrinhos ja faz trinta anos.
espero, no entanto, que preserve essa capacidade de brincar.

parabens ao gaijo.

e quanto a ti, seu grande urso nostalgico, reavivas muitas memorias relativas ao nosso querido pinhal novo para sempre gravadas nestas modestas testemunhas do Senhor

João Paulo Cardoso disse...

Paulo Cristo:
O Nuno bem gostaria de continuar aos carrinhos depois de adulto, mas ao preço a que está a gasolina...

Quanto ao último parágrafo escrito sob influência de substâncias duvidosas, talvez um prato de Cérelac, agradeço os elogios, pelo menos a parte que percebi, antes do comentário se impregnar de misticismo indecifrável.

Um abraço.

Sofia K. disse...

VOLTEI!!!!

Sabes, agora ando sempre com um limãozinho a crescer na barriga e a dar-me pontapés que sei lá o quê!

Adorei o teu texto! O meu presente, quando fiz três anos, chegou dois meses depois e veio em versão dobrada... eram duas pestes! E eu muito zangada, a cegonha acertou no número, mas errou o sexo! Não se pode ter tudo, mas insultei-a tanto que a verdade é que nunca mais bateu à porta lá de casa! Vinte anos depois, parece estar reconciliada e lá para Outubro, faz-me uma visita!

beijos

Mad disse...

Tãos queridos!!!